01/07/17

Yangon


Yangon, ou Rangum como era conhecida no período colonial britânico, é a maior cidade e antiga capital de Myanmar. À semelhança de outras grandes cidades do Sudeste Asiático, esta encontra-se em mudança permanente. No entanto, esta metrópole de 7 milhões de habitantes conserva ainda o charme da era colonial, com decrépitos mas belos edifícios desse período.

Apesar de a capital do país ter sido mudada para a recém erguida cidade de Naypyidaw, é aqui que todo o bulício das ruas de Myanmar atinge o seu expoente máximo, principalmente na zona mais antiga da cidade. É também esta a melhor zona para procurar alojamento na cidade, quer pela proximidade às principais atracções, quer pelo atractivo das ruas transformadas num enorme mercado a céu aberto que a compõem. O facto de chegarmos no dia em que se ficaram a conhecer os resultados das eleições que deram uma vitória esmagadora à NLD de Aung Su Kyi trouxe um bilho especial a esta visita pois tínhamos acompanhado de perto as últimas duas semanas da campanha um pouco por todo o país.


O "coração" desta zona é o Sule Pagoda, uma estupa dourada com mais de 2500 anos de história, construída no local onde seria revelada por um nat (espírito divino pagão integrado na prática do budismo neste país) a futura localização do Shwedagon Paya. Pela sua localização central, este tem vindo a assumir também um importante papel na política do país, tendo servido de ponto de encontro das revoltas de 1988 e de 2007.

A estupa dourada - que serve de rotunda ao trânsito automóvel - encontra-se rodeada de pequenos altares com imagens de Buda. O bilhete de entrada custa 3000 kyats e implica a utilização de um pequeno autocolante ao peito, como é comum em Yangon. O calçado poderá ser deixado à entrada (1000 kyats) ou então ser levado na mão/mochila. É acima de tudo um bom sítio para assistir às preces quotidianas dos birmaneses enquanto circulam várias caixas repletas de donativos.

A partir daqui, há 3 regiões da cidade a explorar:
 - a Norte, o Shwedagon Paya, o lago Kandawgyi, o mercado Bogyoke e suas "ramificações";
 - a Oriente, os principais edifícios da era colonial e o templo de Botahtaung;
 - a Ocidente, a Chinatown e seu o mercado nocturno, bem como a animada rua 19.

Infelizmente muitos viajantes acabam por usar a cidade apenas como ponto de chegada e/ou de partida, dedicando geralmente um dia à mesma. Na nossa opinião, são necessários pelo menos dois dias, idealmente três, para conhecer e sentir a cidade.

Começando pela região norte, é praticamente inevitável a imersão nos seus mercados. O Bogyoke é um mercado fechado, que se dedica à venda de artigos para locais e não tanto para turistas. No entanto, em seu redor todas as ruelas existentes são como que uma extensão do mesmo, com lojas abertas por secções um pouco por toda a parte e invadindo os passeios. Nesta zona, em termos étnicos, é predominantemente indiana, pelo que irão encontrar muitos produtos e restaurantes da região.





Se até aqui é boa ideia caminhar, daqui até ao Shwedagon é melhor recorrer aos transportes públicos. O horário de visita à mais sagrada estupa do país é bastante alargado, pelo que recomendamos que o visitem ao final da tarde. No entanto, pessoalmente acho que é mesmo à noite que este atinge o expoente máximo da sua beleza.



 




Na realidade a estupa dourada de 99 metros de altura, que foi parcialmente destruída e reconstruída em várias ocasiões, é apenas a peça central de todo um complexo de tempos, estupas e pátios de oração. Há vários acessos ao mesmo pelo que convém ter em atenção em que zona se entrou. Actualmente a entrada custa 9 USD ou 8000 kyats.

Mesmo ali ao lado, a leste do Shwedagon, fica o lago Kandawgyi ou lago Real. Este lago artificial construído pelos colonos britânicos para servir de reservatório de água potável é o segundo maior cidade, ficando apenas atrás do lago Inya, localizado na região noroeste da cidade e ao qual se encontra ligado por tubagens subterrâneas. O lago Inya, apesar de maior, não tem grandes atractivos e fica longe do centro, sendo mais conhecido por ter sido o local onde Aung Su Kyi esteve em prisão domiciliária durante as últimas décadas.

Este é um excelente local para descontrair e onde os locais fazem de tudo um pouco. Fomos convidados a sentar com uma família local que fazia um pic-nic no parque e caminhamos pelos seus passadiços até a uma estranha embarcação dourada que serve de restaurante, que infelizmente estava encerrado à hora que visitamos. Uns metros adiante, há dois cafés com esplanada que tanto servem de abrigo do calor como de uma eventual chuvada súbita, como foi o nosso caso. Para quem estiver interessado, o Zoo é mesmo em frente ao parque.

Ainda nesta zona mas um pouco mais a norte, existem 2 templos menos conhecidos, muito pouco turísticos, que merecem ser visitados. Um deles, o Chauk Htat Gyi, alberga um dos maiores budas reclinados do mundo (16m de altura e 65 de comprimento). Não havia preço estipulado à entrada sendo no entanto necessário um donativo.



O outro, o Nga Htat Hyi que fica do lado oposto da estrada, alberga um dos maiores budas sentados. Este último ainda funciona como mosteiro (o anterior tem um mosteiro ao lado) e o bilhete de entrada custa apenas 2000 kyats.



Regressando então ao centro da cidade, aconselhamos vivamente uma caminhada pelos principais edifícios do período colonial. Aqui irão encontrar uma mescla de edifícios governamentais importantes razoavelmente preservados com outros - muitos mais - aparentemente entregues ao abandono e a necessitar de intervenção urgente. Alguns dos edifícios mais imponentes e trabalhados da cidade têm literalmente árvores a crescer nos telhados e brotando de fissuras nas suas fachadas. Os edifícios residenciais são emaranhados de antenas, cabos e árvores.


Logo no início do percurso irão encontrar o moderno monumento da Independência, construído para comemorar a celebração da independência do império Britânico. Este foi construído no parque Maha Bandoola, em homenagem ao general que combateu as forças inglesas na primeira guerra entre birmaneses e britânicos. Destacam-se ainda nos limites do parque a Câmara Municipal e o Tribunal Superior.


Prosseguindo o percurso sempre em direcção ao rio (sudeste em relação ao Sule Pagoda e ao parque), chega-se à zona de Botataung, que alberga um complexo de templos com o mesmo nome. Neste complexo, existem no centro os templos, estupas e relicários centrais que se julga que tenham sido construídos pelo povo Mon na mesma altura em que construíram o Shwedagon. O edifício principal é particularmente bonito, pois é todo ele dourado no interior.


Em seu redor, a construção imparável de mais salas, templos e estupas é evidente. Nos relicários, irão encontrar um dente e cabelos de Buda, mas a principal atracção é mesmo a devoção incomensurável deste povo.


Numa destas salas, para além da imensa quantidade de oferendas, havia mesmo quem desse leite à boca das divindades enquanto lhes segredavam ao ouvido, quiçá solicitando intervenção divina em algum assunto premente. O bilhete de entrada custa 3000 kyats ou 3 USD.


Uma boa forma de alcançar e/ou regressar deste templo, são os riquexós a pedal, que deverão cobrar uns cêntimos, incluindo o tempo de espera enquanto se visita o templo. Cuidado ao negociar o preço e efectuar o pagamento no final, se surgir um "0" a mais no final, sorriam educadamente e mantenham-se pelo preço acordado. Caso contrário, basta atravessar a passagem pedonal superior por cima da avenida (Strand Road) e desembocam num mercado de frescos que existe mesmo ali ao lado.

Por fim, e após longas caminhadas extenuantes ao implacável sol birmanês, a descontração e a diversão na zona a oeste do nosso ponto de referência, o Sule Pagoda. Ao final da tarde os passeios da Chinatown começam-se a encher de bancas, algumas vendendo produtos frescos mas predominando as bancas de comida de rua. Aqui a oferta é imensa, passando pelas culinárias chinesa, birmanesa e até indiana, com pratos para todos os palatos. A oferta de insectos é abundante (muito superior a qualquer outra capital da região) e estes são ainda salteados no wok antes de consumidos. Escusado será dizer que os preços são simbólicos para os padrões ocidentais.


A noite geralmente termina na rua 19 e suas adjacentes, onde se localizam os restaurantes mais turísticos da Chinatown e onde se concentram algos dos bares mais populares entre os locais. Esta é também uma boa zona para comprar utensílios domésticos e pequenos aparelhos de electrónica, embora a maior parte das lojas encerrem à noite.

Uma das actividades mais populares entre turistas independentes é o comboio circular, que percorre uma linha que percorre os subúrbios da cidade. Sinceramente, acho que é uma experiência interessante para observar a vida dos locais nos complicados subúrbios da cidade, frequentemente repletos de lixo. No entanto, acho que não faz sentido fazer a volta completa pois a certa altura torna-se monótono e repetitivo.



No entanto, vale a pena conhecer a estação de comboios (onde encontrei uma casa de câmbio com uma das melhores taxas) e ainda mais experimentar os velhinhos autocarros de Yangon (o bilhete custa um punhado de cêntimos e a experiência é inesquecível). Como provavelmente não irão perceber o que o "pica" apregoa, aproveitem a viagem para regressar a um ponto conhecido (Sule Pagoda, por exemplo), perguntando se passa nas suas proximidades.


Por fim, é frequente ouvir-se dizer que Yangon é "Bangkok há 50 anos atrás". Obviamente não conheci a Bangkok dessa altura mas embora compreenda a comparação, as cidades parecem bastante diferentes na sua essência, tal como os seus povos. Yangon preserva marcas abundantes de todo um passado colonial que não existe no país vizinho. As etnias que compõem a sua população são também marcadamente distintas, o que se reflecte na sua cultura, gastronomia e organização, conferindo-lhe uma identidade muito própria que parece preservar apesar de já não ser capital do país e de se encontrar em pleno processo de modernização. Não sou fã de grandes cidades mas Yangon foi sem dúvida uma daquelas que mais gostei de conhecer e agora de relembrar.

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