07/09/12

Tiraspol

O primeiro post relativo a destinos visitados diz respeito ao único que não aparece no mapa, porque pura e simplesmente não é reconhecido como tal pela comunidade internacional. 

A Transnístria (ou Pridnestrovia, Transdnister, etc) é uma república de facto independente mas apenas reconhecida pelas repúblicas da Abkhazia, Ossétia do Sul e Nagorno-Karabach, todas elas também repúblicas de facto independentes não reconhecidas pela comunidade internacional.

Quando digo que é de facto independente, digo-o porque apesar ser parte da Moldávia, esta tem as suas próprias fronteiras, controladas pelo seu próprio exército. Tem também o seu próprio governo, moeda, passaporte, etc.

Esta república separatista, com cerca de 500 mil habitantes, surgiu após uma aproximação da Moldávia à Roménia, com vista à re-integração da mesma (antes da 2ª Guerra Mundial a Moldávia era Romena). O problema é que para lá do rio Nistru (daí o nome), a população é maioritariamente eslava, descendente de Russos e Ucranianos. Estes temendo ser anexados à Roménia, proclamaram então a independência em 1990, com o apoio da URSS. Após a independência da Moldávia, iniciou-se então uma guerra que durou até 1992, altura em que foi assinado um cessar-fogo, mantido por uma força de manutenção de paz constituída por militares russos. A questão torna-se ainda mais complicada se tivermos em conta que esta parte da Moldávia, antes de ser Moldávia, era Ucraniana.

A capital do País, e maior cidade, é Tiraspol (sendo a segunda maior cidade da Moldávia, logo a seguir à capital Chisinau). É uma cidade tipicamente soviética, onde ainda reinam a propaganda bem ao estilo soviético e só recentemente começou a haver alguma abertura ao exterior, assim como ao investimento estrangeiro.

 Durante anos o país foi tido precisamente como que um "parque temático", um local onde a URSS nunca acabou. Há também relatos de que é um paraíso do crime, onde reina o tráfico de armas, pessoas e drogas. Por fim, mas não menos importante, há inúmeros relatos de pessoas que foram extorquidas pelos guardas fronteiriços. Quando visitamos um país como este, convém não esquecer que não sendo reconhecido, não tem embaixada de país algum (à excepção dos 3 em situação semelhante supra-citados).

Pois bem, corria o mês de Julho do ano corrente e terminamos o nosso périplo pelo Leste precisamente em Tiraspol, restando-nos apenas 1 dia para regressarmos a Bucareste, via Chisinau, para apanharmos o voo de regresso.


 No dia 16 de Julho, às 7 e tal da manhã apanhamos em Chisinau o comboio para Odessa (o único do dia para Tiraspol). O comboio apesar de muito diferente (bancos em madeira, tipo bancos de jardim) encontrava-se surpreendentemente em bom estado e limpo! Aproximadamente 1h e pouco depois da saída, chegamos à fronteira. Tudo decorreu normalmente, pediram-nos o passaporte (guardas da Moldávia e depois da Transnístria) e seguimos caminho. Reparamos no entanto, que não carimbaram os passaportes. Pouco depois chegamos a Tiraspol.

 Estação de Comboios - Tiraspol


O primeiro desafio, foi orientarmo-nos com um pequeno mapa da reserva do hotel para o encontrarmos (o Triposo no meu iPhone teimava em não nos colocar no mapa...). Surpreendentemente, o primeiro jovem que encontramos pelo caminho falava um inglês fluente! Este explicou-nos que ainda era um pouco distante dali, qual o mini-bus que devíamos apanhar e preço a pagar. Pouquíssimos minutos depois, eis que passa o dito mini-bus, fizemos sinal para parar. Entramos, o motorista não quis dinheiro algum e um polícia (!) que ia no banco do meio, explicou-lhe onde era o hotel e avisou-nos onde devíamos sair. Começou a caminhada final, com muitos pedidos de indicações pelo meio - ninguém falava inglês ou qualquer outra língua ocidental. Nem mesmo o pouco Romeno que fui aprendendo na semana anterior (nota: a língua Moldava é basicamente Romeno) me serviu de alguma coisa. Mais gesto, menos gesto, mais rua, menos rua, chegamos ao City Club Hotel. Um Hotel 4 estrelas, recente e melhor que muitos 4 estrelas ocidentais, localizado num bairro residencial, a escassos 500 a 700m da rua principal. Caro apesar de tudo, especialmente tendo em conta o país onde nos encontrávamos. Reservamos no Booking por 94e mas devido às grandes flutuações diárias do Rublo da Transnístria, explicou-nos a menina da recepção, tivemos que pagar 104e. Esta explicou-nos também que embora para estadias inferiores a 24h não fosse necessário registarmo-nos no Ministério, era suposto terem-nos carimbado o passaporte ou terem-nos feito qualquer tipo de registo. Esta pediu-nos os passaportes e tratou-nos do assunto.

Voltando ao que realmente interessa, instalados no quarto e após uma breve soneca e um banho, saímos para explorar Tiraspol. Após uma primeira passagem pela rua principal - 25 de Outubro, decidimos almoçar. A escolha não era muita, Tiraspol tem poucos restaurantes e se excluirmos aqueles que têm aspecto duvidoso e os mais carotes, então a escolha fica mesmo limitada. Optamos então pelo Andy's Pizza, uma espécie de rede moldava bem ao estilo americano - parece um McDonalds - mas que serve desde pizzas e pasta, a pratos mais tradicionais como espetadas, sopas, etc. Aí o empregado adolescente, o único que falava inglês, explicou-nos que só aceitavam Rublos da Transnístria (isto depois de termos levantado Rublos Russos na única ATM que encontramos - a alternativa era levantar Dollars Americanos, a máquina não tinha Rublos locais). Fui então a um banco trocar o meu dinheiro e lá almoçamos por uns 7euros (2 pessoas).

Voltamos para a rua principal, passamos, entre outras atracções, pelo Memorial da Guerra da Independência, Cemitério dos Heróis, Chama Eterna e pelo Tanque Soviético, orgulhosamente exibido nesta praça central da cidade. Metros à frente, do outro lado da avenida, encontrava-se o Parlamento, com uma imponente estátua de Lenine na sua frente. Uns metros ao lado, o Monumento Suvorov e uma faixa comemorativa da independência. Passamos ainda pelo Palácio dos Soviéticos, mas infelizmente já não havia bateria nem na máquina, nem no iPhone e como tal não há fotos do mesmo.




Memorial da Guerra da Independência

Ana Costa no ao lado do Cemitério dos Heróis

Monumento Suvorov

Parlamento, Lenine "esvoaçante" na frente

Seguimos para as margens do rio Nistru, onde aproveitamos para descansar à sombra, enquanto apreciávamosos locais em barcos antigos e gastos pelo tempo, com música aos berros, que aguardavam mais clientes para zaparem para uma espécie de mini-cruzeiro pelo rio. No final da tarde, decidimos prosseguir a caminhada até ao único centro comercial da cidade (pelo menos no centro). Não tinha realmente qualquer semelhança com os nossos "Shoppings", não sendo mais que um espaço dividido por umas paredes falsas metálicas em várias lojinhas de comércio tradicional.

Ana Costa na margem do Nistru

 Por fim, tentamos visitar a Igreja da Natividade, mas já se encontrava fechada.

Igreja da Natividade

 Regressamos então ao hotel, onde iríamos jantar por cerca de 16 euros (2 pessoas). Regressamos ao quarto e embora ainda tivessemos vontade de conhecer a cidade à noite, sabíamos das viagens longas que teríamos que fazer no dia seguinte. Sabíamos também que se perdessemos qualquer um dos transportes programados corríamos o risco de não chegar a tempo a Bucareste. Desistimos então da ideia e fomos dormir.

 No dia do regresso, de manhã cedo, fomos novamente para a estação de comboios que era também o local de onde supostamente saía o autocarro para Chisinau. Só que autocarro não existia, apenas mini-bus ou Marshrutkas em russo (Ruteria em Romeno). Saímos então numa carrinha de 9 lugares "kitada" que levava 20 e tal pessoas, algumas em bancos de cozinha (!). Chegamos à fronteira, aquí sim, com algum receio extra de sermos extorquidos para podermos sair. Nada disso, pegaram no passaporte, olharam para nós, ficaram com os papeizinhos do Ministério (onde estava o carimbo...) e seguimos o nosso caminho.

 Em suma, este país oficialmente inexistente, existe "de facto". Não é muito diferente da Moldávia, até mesmo na população, mas isto porque me pareceu existir uma influência russa muita maior do que seria suposto na própria Moldávia. Esta era a zonha que detinha o grosso da indústria da Moldávia, e assim permanece. Como tal, parece-me que se irá manter o status quo actual durante algum tempo, visto que o reacender da guerra é praticamente impossível, visto que seria sempre demasiado destrutivo para ambos os lados. Falta saber quanto tempo se aguentará um regime não reconhecido e o desgaste que isto poderá provocar na própria República Moldava.
 Os receios com que a internet nos inundou, pareceram-nos de todo infundados (ou então tivemos muita sorte...). A viagem decorreu sem problemas, tal como a nossa curt(íssim)a estadia.


A título de curiosidade, que lunetas são estas?!
 E foi isto o nosso "salto" a Tiraspol, capital de um país "de facto" que para o Ocidente não existe!

3 comentários:

  1. O quê, deixaram-te tirar fotos ao Palácio do Governo? Quando lá estive, disseram-me que era proibidíssimo. :/

    (Andy's Pizza... há coisas que não mudam. Já em 2009 era a única opção de jeito!)

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  2. Não sei se a proibição de tirar fotos ao Palácio do Governo continua ou não. Só soube pelo teu blog que existia esta "lei". :) A nós ninguém nos informou de nada.

    Andy´s Pizza a salvar a malta desde 1800 :) Bom ter-te por cá!

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  3. Também tirei fotos à vontade. De tudo. Em 2012.

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